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Comunicação no marketing industrial: novos pontos de vista

Cristiano Ramos de Souza

12 de Setembro de 2019

Cristiano Ramos de Souza

Este artigo é uma tentativa de responder a algumas perguntas que têm me sido feitas nos últimos tempos.

A comunicação no marketing industrial é um tema recorrente, que já foi objeto de vários artigos nesta revista (dois deles de minha autoria, no nº 23, de outubro de 2003, e nº 31, de dezembro de 2005). Estou, porém, retomando o assunto sob novos ângulos. Minha proposta é refletir sobre três perguntas específicas, como se estivesse desenrolando um novelo e usando a linha para amarrar alguns conceitos.

Sabemos que há diferenças entre a comunicação do marketing de consumo e aquela que se destina ao marketing entre empresas ou marketing industrial, chamado ainda de B2B.

Vamos às perguntas.

1.QUAL A LÓGICA DE UM FILME PUBLICITÁRIO NO B2B?

A quem se destina? Para que serve?

Primeiramente, é importante ter em mente que:

Vender produtos ou serviços para milhares ou milhões de usuários finais é obviamente diferente de vender produtos ou serviços para empresas que irão usá-los (ou incorporá-los) em seus processos industriais. Óbvio, mas não simples.

Algumas considerações iniciais:

A eterna discussão da necessidade e do tamanho do investimento na comunicação no B2B continua.

Não estamos discutindo a comunicação pessoa a pessoa, que é fundamental na relação do B2B, uma vez que prédios e máquinas não se comunicam; são as pessoas que se comunicam entre si.

O grande ponto é que, no B2B, na maioria das vezes, conhecemos o nosso interlocutor. Nesse caso, nada mais eficiente e natural do que procurá-lo para uma “conversa” pessoal.

No mundo do consumo, o chamado “consumidor” é um ser idealizado. Através de pesquisas, planejamentos e simulações chega-se a uma pessoa perfeitamente descrita em suas características individuais, local provável em que vive e hábitos de consumo.

Assim, uma empresa que vende fraldas descartáveis “sabe” que precisa se comunicar com mães das classes sociais A, B e C, com filhos entre 0 a 2 anos, preocupadas com a saúde de seus filhos e tantos outros atributos que se queiram designar, visando posicionar o produto em um público específico.

Depois dessa caracterização, os profissionais do marketing e seus companheiros voltados especificamente à comunicação se deparam com o eterno dilema. Quem é essa mulher, onde ela mora, como falar diretamente com ela?

Nessa hora, os profissionais de Mídia são de grande ajuda. Por meio de estudos de perfil, eles indicam que meios (veículos de comunicação) essa “consumidora” provavelmente irá acessar.

Hoje em dia, além das mídias tradicionais (televisão, revistas, jornais, outdoor, etc.), temos o enorme mundo das mídias sociais.

Diante de todas essas alternativas, são criados planos de comunicação para se atingir essa consumidora.

Apesar do grande custo e dos riscos de dispersão, essa é a única alternativa para o mundo do marketing de consumo se comunicar com seus prováveis clientes.

Voltando ao nosso mundo do B2B, gostaria de propor uma divagação coletiva aos especialistas desse universo.

Qual é realmente o percentual de clientes com os quais decidimos nos comunicar (clientes escolhidos) e cujos nomes e endereços não conhecemos?

Não há dúvidas de que a comunicação direta é melhor e mais eficiente do que qualquer outra alternativa disponível.

Como já propus anteriormente, não há nada ou ninguém melhor para falar de sua empresa do que você, pessoalmente.

Existem possíveis clientes com os quais queremos nos comunicar, mas não sabemos exatamente quem são, nem seus endereços. Nesse caso, estamos na mesma situação que nossos amigos do marketing de consumo.

Dito isso, pode parecer que usar os mesmos procedimentos do marketing de consumo resolveria nossos problemas.

É nesse ponto que gostaria de convidar nossos leitores a verificar quais características particulares temos, no mundo B2B, que nos levariam a procedimentos diferentes para um aparente problema comum.

No mundo do consumo, a televisão ainda tem uma enorme penetração. Não é à toa que as maiores verbas de comunicação são investidas nos canais abertos. Apesar de que, hoje em dia, cada vez mais as mídias do mundo digital e das redes sociais estão no foco das empresas de consumo.

A grande pergunta para nós, do B2B, seria: Onde está a melhor alternativa para nos comunicarmos com os possíveis clientes que não sabemos onde estão exatamente?

Depois dessa etapa, ainda nos resta resolver o que queremos comunicar a eles.

No consumo, a comunicação geralmente fala de um conceito, que vende um benefício, e “tenta” levar o consumidor a se decidir a optar pelo produto, assim que se deparar com ele num ponto de venda.

Sabemos que no mundo B2B as decisões para optar por um produto ou serviço industrial são bem mais complexas e passam por mais passos do que simplesmente o benefício direto que aquele produto pode proporcionar. Isso nos conduz à próxima pergunta.

2.ENTÃO, QUAL É A LÓGICA DA COMUNICAÇÃO NO B2B?

A lógica da comunicação no mundo do consumo é mais imediatista.

É logico que todos querem transmitir um conceito, pois sabemos que se o produto ou serviço tiverem um significado há uma maior chance de uma relação mais duradoura com aquela marca e não simplesmente com aquele produto.

Acabo de entrar em outra área altamente pantanosa, principalmente para o universo do B2B. Qual o valor da marca no mundo das relações entre empresas?

No meu entender existe valor da marca no mundo B2B, não tenho dúvidas. A questão é qual é esse valor.

Essa é uma eterna discussão, que poderemos estudar com mais profundidade em outra ocasião. De qualquer forma, o papel da comunicação será: divulgar e conceituar nos corações e mentes dos nossos queridos clientes escolhidos a nossa marca.

Aí entramos em outra área nebulosa. Qual a melhor estratégia e que caminhos devemos seguir, do ponto de vista da comunicação, para divulgar e posicionar uma marca e nossos produtos e serviços no mundo do B2B?

Precisamos ter em mente que, na realidade, a marca de uma empresa não pertence a ela. Parece um contrassenso? Senão vejamos: Uma marca é uma promessa baseada na expectativa que alguém tem dela.

Quando vemos uma marca, imediatamente uma série de lembranças e imagens nos vem à mente. Essas imagens se transformam em expectativas, mas as empresas não têm domínio sobre as mentes dos clientes.

Eles criam suas imagens a partir de experiências próprias ou de terceiros que a empresa produziu ao longo de sua existência. Portanto, a percepção da marca não pertence à empresa e sim está na mente e no coração de cada cliente.

Assim, um guia que pode ajudar as empresas a cuidar de suas marcas – mais do que grandes investimentos em comunicação – é ter os mesmos cuidados que uma pessoa tem com sua imagem pessoal.

Uma pessoa saudável, geralmente, tenta causar uma primeira boa impressão. Esse conhecimento vai se desenvolvendo com o tempo, que vai acompanhando a evolução da pessoa. Invariavelmente, uma das características que valorizamos nas pessoas é sua coerência ao longo do tempo.

Mesmo que uma pessoa de quem gostamos tenha algum “defeito”, quando temos uma admiração por ela essa característica é relegada a um segundo plano.

A relação verdadeira que nos une a uma pessoa é a percepção de valor que temos dela. E esta é provavelmente a mesma relação que temos com marcas e pessoas que trabalham nas empresas com as quais temos relação. Portanto, cuidar de uma marca é muito parecido com a maneira como cuidamos de nós mesmos.

Mas voltemos a nossa discussão principal de como proceder com a comunicação.

Uma vez decididos que temos de nos comunicar com nossos clientes e também de cuidar de nossa marca, a decisão é como fazer isso. Aí chegamos à nossa terceira pergunta.

3.COMO COMPOR UM BUDGET DE COMUNICAÇÃO PARA UMA EMPRESA B2B E QUAIS CAMINHOS A COMUNICAÇÃO DEVE PERCORRER?

A decisão de quanto devemos investir na comunicação no B2B ainda não tem consenso. Depende muito do estágio em que a empresa se encontra e dos objetivos a serem atingidos com a comunicação.

No mundo do consumo, existia um número mágico que pode variar entre 5% e 15% sobre o faturamento. Essa variação é determinada pela característica do segmento em que a empresa opera.

Assim, por exemplo, empresas de bebidas altamente dependentes de comunicação e com altas margens investem um percentual maior de seu faturamento. Empresas de bens de consumo, como cosméticos, já praticam percentuais um pouco mais baixos, até chegarmos a segmentos como, por exemplo, alimentos, que opera com percentuais bem mais baixos; mas até mesmo esses percentuais são, hoje, altamente discutíveis.

No mundo B2B, esse percentual sequer foi discutido, tamanha a diversidade das empresas e de seu segmento. Porém, empiricamente, acredito que ele deve ser muito mais baixo do que no mundo do consumo.

Acredito que o valor a ser investido tem mais a ver com os objetivos do que com um número mágico ideal. Há de ser um valor que caiba no orçamento da empresa, sem que isso represente um comprometimento de outras áreas de investimento.

Uma vez que a construção de valor no B2B se faz principalmente nas relações entre as pessoas, deveria ser aí o maior investimento da comunicação entre as empresas.

Qualquer investimento que propicie a melhoria dessa aproximação entre as pessoas seria bem-vindo.

No entanto, temos outras formas diferentes de comunicação que podem servir para estreitar o relacionamento com clientes e fornecedores.

Aliás, não nos esqueçamos deste segundo importante grupo, pois ele ajuda a construir nossa imagem – assim como nossos clientes – e é parte integrante da cadeia de valor de uma empresa. Examinemos algumas dessas formas de comunicação:

a. Programas monitorados de visitas às unidades da empresa. Essas visitas, quando bem organizadas, podem ser momentos memoráveis dos quais os clientes não se esquecem por vários anos do relacionamento. São momentos de grande percepção de valor.

b. Atividades no desenvolvimento de pessoas em nossos clientes e fornecedores, nas áreas de melhoria de capacitação. Esse investimento pode ser creditado à área de comunicação e é um grande construtor de valor.

c. Participação em feiras e jornadas é sempre discutida. Minha opinião é: só vá se sua empresa tem algo a acrescentar, do ponto de vista de divulgação, que não possa ser feito pessoalmente com um cliente escolhido, principalmente na casa do cliente ou em nossa casa.

Um exemplo disso é mostrar uma tecnologia que seria de grande impacto quando mostrada ao vivo, algo impossível de se levar ao cliente.

Ir a um evento só porque os concorrentes vão e só para “fazer relacionamento” não me parece um bom investimento.

d. Patrocínio e investimentos sociais e culturais podem ser uma ótima maneira de comunicar aos clientes e à sociedade no que acreditamos e o que valorizamos. A grande discussão tem sido: O que essas atividades agregam diretamente aos negócios? Na maioria das vezes, nada ou muito pouco. A pergunta é: por que fazê-las? A resposta é: quando feitas de uma forma genuína e que represente um valor em que a empresa acredita, podem ajudar na construção da percepção que nossos clientes, fornecedores e, nesse caso, a sociedade terão de nós.

A maior dificuldade é integrar os colaboradores a essas atividades de tal forma que elas sejam genuínas da empresa e não só de um seleto grupo interno e, por vezes, exclusivamente do “dono” ou da família do fundador.

e. Atividades de Relações Públicas e Comunicação Externa ou Interna, através de agências especializadas, são sempre bem vindas, pois podem ajudar a empresa a buscar as melhores alternativas nessas áreas. O segredo é encontrar parceiros que têm valores parecidos com os da empresa e cuja relação comercial seja uma parceria de ganhos compartilhados para os dois lados. É importante que se discuta de antemão quais as expectativas de ganhos e investimentos de cada lado.

4.OUTRAS QUESTÕES RELEVANTES

Dito isso, acredito que temos ainda três questões importantes que devemos discutir e que guardei para o final.

A primeira é o uso da internet nas comunicações com os clientes.

Acredito que a internet é um poderoso canal de comunicação para facilitar as transações com os clientes e fornecedores. Não há dúvidas de que nossos parceiros querem estar cada vez mais conectados conosco.

Essa conexão facilita o processamento de informações, tanto na área de pedidos como em logística e faturamento, deixando-as rápidas, confiáveis e transparentes.

O ponto a ser analisado é se isso é comunicação no sentido que estamos discutindo até agora. A empresa que acreditar que um bom sistema de processamento de dados com seus clientes pode fazê-la prescindir de uma comunicação mais direta está cometendo um grande engano. O contrário também é verdadeiro. O fato de se ter um bom relacionamento com nossos clientes não substitui um sistema moderno e eficiente de troca de informações técnicas e operacionais, usando os meios eletrônicos. Mas são atividades fundamentalmente diferentes, ainda que possam parecer substituíveis; quando muito são complementares.

O segundo ponto a discutirmos são os investimentos na chamada comunicação institucional.

Essa rubrica tem sido usada por “agentes” internos ou externos de áreas de comunicação ou agências de publicidade, e tem consumido grandes investimentos em propaganda, muitas vezes com filmes caríssimos e em horários nobres na televisão.

A grande pergunta é: quanto isso realmente contribui para a construção da imagem? Qual o tamanho que esse investimento deve ter? Qual a real percepção que os clientes têm de uma empresa industrial disputando espaço no horário nobre com cervejas, bancos e shampoos? Qual o retorno desse investimento?

A resposta é: não sei.

Marketing não é uma ciência exata. A comunicação talvez seja a parte menos precisa do marketing. Portanto, desde os primórdios da comunicação empresarial, as questões acima intrigam e desafiam as altas administrações que têm de escolher onde vão investir seus preciosos e escassos orçamentos.

O que sei é que há investimentos que, mesmo que não façam mal, só devem ser feitos se o dinheiro estiver sobrando. É o mesmo tipo de decisão quanto a termos uma série de equipamentos estratégicos duplicados em nossas unidades fabris, caso falhem os que estão em operação. Seria até desejável, mas o custo dessa prevenção pode não ser compatível com o investimento.

A análise que deve ser feita é se devemos divulgar uma empresa que negocia quase que exclusivamente com outras empresas, em um meio altamente competitivo e caro voltado originalmente a produtos de consumo, que não têm muitas outras alternativas de se comunicarem com seus consumidores. Penso que isso é no mínimo questionável.

É bom lembrar que estamos falando de valores que nos dias de hoje estão por volta de R$ 350 mil a R$ 400 mil por 30 segundos, em horários nobres, e que um plano de veiculação eficiente deve contemplar muitas aparições.

Como disse antes, somente se o dinheiro estiver sobrando – fenômeno que aparentemente só assola as empresas públicas, com espantosa frequência – as empresas industriais deveriam considerar esse ponto.

No entanto, esse item é altamente polêmico; acredito que possa haver momentos muito particulares em que se justifique tal investimento.

Finalmente, o ponto de maior relevância, na minha opinião, na comunicação entre empresas, é a comunicação interna.

Não estou falando do famigerado endomarketing (que me parece um nome de alguma doença contagiosa) ou de jornais internos, sistemas de comunicações com cartazes ou quadro de avisos.

Não sou contra nenhum deles. Quando bem executados, podem até ajudar.

O que estou falando é da real e genuína comunicação entre as pessoas dentro das empresas. Especialmente nas relações entre gestores e colaboradores – onde as informações cruciais das empresas devem acontecer. É nas comunicações entre o “chefe e o subordinado”, tanto individual como em grupo, quando o que foi decidido “lá em cima” (onde quer que esse “em cima” possa estar) é transmitido.

Acredito que, se formos pesquisar a causa-raiz dos problemas das empresas, entre 60% e 70% estão em falhas na comunicação. Os gestores pensam que se comunicam com seus colaboradores, pelo simples fato de terem “falado” uma vez sobre qualquer assunto.

A falta de um real entendimento das características pessoais de cada comandado, aliada à falta de um ambiente de confiança que infecta a maioria dos ambientes empresariais, somados ao natural estado do ser humano, de sempre estar pensando no futuro, como fala nosso mestre José Carlos Teixeira Moreira, faz com que a comunicação interna seja, no meu entender, a maior responsável pela imagem das empresas.

Como já vimos anteriormente, e tem sido tão divulgado pela JCTM e EMI, a relação entre empresas se fundamenta na relação entre pessoas. Portanto, quando as pessoas de uma empresa não estão conectadas à real missão da empresa e ao seu real objetivo, o que transmitirão aos clientes é uma colcha de retalhos de percepções individuais.

Se existe uma área em que as empresas deveriam concentrar seus maiores investimentos em comunicação, esta deveria ser a melhoria das comunicações internas genuínas ente as pessoas. Não sei precisar onde começa a causa e onde termina o efeito, mas parece que a relação de confiança tão almejada nas organizações está intimamente ligada aos processos internos de comunicação. Não tenho dúvidas de que um ambiente de confiança é a base para uma boa comunicação.

Qualquer esforço nesse sentido, tenho certeza, irá se refletir diretamente na melhoria da percepção que nossos clientes, fornecedores e a sociedade terão da empresa.

Essa é uma missão que está indubitavelmente nas mãos da alta administração. É por meio dela que a empresa atingirá patamares de percepção que a colocarão em uma posição de admiração nos mercados em que atuam e terá com certeza resultados igualmente admiráveis.

Temos um enorme espaço para novos aprendizados. Sem dúvida, essa é uma das áreas de maior oportunidade de desenvolvimento no marketing industrial.

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